sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Resoluções dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente

A criação dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente deve ser, por isso, decorrente de figuras legislativas próprias e específicas de cada uma daquelas esferas de governo, isto é, federal, estaduais e municipais, senão, em virtude mesmo do pacto federativo, segundo o qual tais entes jurídicos de direito público interno possuem âmbitos de competência limitados a suas respectivas autonomias. Não fosse isto, observa-se que no regime democrático do Estado de Direito brasileiro a criação, organização, sistematização, estruturação e funcionalidade de instituições públicas, por certo, demandam previsão legal (princípio da legalidade) cuja preceituação, na verdade, limita o âmbito de discricionariedade administrativa daquelas instâncias de governo.
O mencionado inc. II, do art. 88, do Estatuto, também, preceituou a natureza jurídica dos Conselhos dos Direitos reconhecendo-lhes, pois, como “órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis”, bem como lhe determinou metodologia democrática e constitutiva própria, estimulando, assim, a “participação popular paritária por meio de organizações representativas”, quando, não, declarando que a função dos membros de tais Conselhos “é considerada de interesse público relevante”, conforme dispõe o art. 89, do Estatuto. No entanto, convém ressaltar que os Conselhos dos Direitos se encontram no marco das diretrizes da “Política de Atendimento dos direitos da criança e do adolescente”, a qual se realiza “através de um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais”, nos termos do art. 86, do Estatuto.
Em face disto, é pertinente não só jurídico-legal, mas, também, politicamente, entender que as decisões adotadas pelos Conselhos dos Direitos, no fundo, constituem-se em resoluções, isto é, em determinações normativas e, por isso, vinculativas de instituições legal e democraticamente constituídas para o estabelecimento de políticas públicas que se constituem em parâmetros, diretrizes, orientações, fontes de lei e do Direito da Criança e do Adolescente.
As decisões adotadas por deliberações que são oriundas do amplo e democrático debate plural que devem ser estabelecidos nos Conselhos dos Direitos – seja o Nacional (CONANDA)[1], sejam os Estaduais, sejam os Municipais –, constituem-se, na verdade, em resoluções, precisamente, por estabelecerem políticas públicas, consoante dispõe o inc. II, do art. 88, da Lei Federal nº 8.069, 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), pois cuidam de assuntos e temáticas que importam na prevenção, promoção e defesa dos direitos e garantias afetos à infância e juventude. Os mecanismos estabelecidos legalmente para que os Conselhos dos Direitos possam adotar decisões através de deliberações colegiadas acerca das “formas, meios e modos”[2] para priorização absoluta dos direitos afetos à infância e à juventude, enquanto políticas públicas de atendimento e correção das “ações em todos os níveis”.
Não se pode olvidar, a adoção e existência de resoluções recomendativas que são utilizadas para comunicar e solicitar de outros órgãos e instituições públicas o desenvolvimento de estratégias em rede que são inerentes a suas respectivas atribuições legais, respeitando-se, assim, a independência e autonomia administrativa e funcional de tais entidades públicas.
Porém, o reconhecimento de distintas espécies de resoluções –normativas (determinativas) e recomendativas – e a finalidade (destinação) a que se dirigem, importa, pois, na confirmação de que, em regra, as resoluções são determinações vinculativas que obrigam o legislador, o julgador e o administrador público[3], como, por exemplo, restou consignado na decisão judicial proferida pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça a partir do relatório lavrado pela Ministra Eliana Calmon, para quem, “a execução de política específica, a qual se tornou obrigatória por meio de resolução do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente”, pode ser exigida e tutelada judicialmente “a fim de atender as propostas políticas certas e determinadas.”[4].
Ademais, pontue-se que todo e qualquer imperativo legal deve ter ampla publicidade, em decorrência mesmo da exigência ético-política de transparência administrativa que se impõe para o tratamento de assuntos cujo interesses pertence a todos. Para além disto, busca-se através da publicidade das resoluções adotadas pelos Conselhos dos Direitos não só o conhecimento das ações e programas específicos (políticas públicas), mas, principalmente, a “mobilização da opinião pública no sentido da indispensável participação dos diversos segmentos da sociedade”, nos termos do que dispõe o inc. VI, do art. 88, do Estatuto.
A mencionada figura legislativa – inc. VI, do art. 88, do Estatuto –, preceitua que a mobilização da opinião pública se constitui numa das diretrizes da política de atendimento da criança e do adolescente. Entretanto, não é apenas isto, pois tal mobilização também se destina ao senso comum jurídico-legal, bem como às demais instâncias de poder (legislativo, administrativo e judiciário), enquanto vertentes das diretrizes e linhas de ação da política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente.
E isto jurídico-legalmente se opera através da indispensável publicação oficial das resoluções normativamente deliberadas e emanadas pelos Conselhos dos Direitos, “cujas determinações vinculam a vontade do administrador público” – como afirmou a Ministra Eliana Calmon –, impondo-se, pois, a sua publicação no diário oficial respectivo (da União, dos Estados ou dos Municípios), para que, assim, possam ter iniciado os seus efeitos legais externos[5].
Pois, como se viu, as resoluções emanadas dos Conselhos dos Direitos, uma vez publicadas nos respectivos Diários Oficiais[6], tornam-se determinações vinculativas que demandam o integral cumprimento de programas previamente deliberados e estabelecidos por aqueles conselhos enquanto expressões das ações conjuntas das entidades governamentais e não-governamentais orientadas pelo primado constitucional da descentralização político-administrativa que se opera através do viés paritário.
Os Conselhos dos Direitos enquanto órgãos deliberativos devem observar o regime democrático, aqui, respeitado através do asseguramento da “participação popular paritária”, pois, tal estratégia não pode se constituir numa mera metodologia decisionista sobre assuntos de interesse público que são pautados naquelas espacialidades públicas da palavra e da ação[7].
No fundo, as resoluções alcançadas por meio de ampla discussão deliberativa deve continuar sendo representativa do movimento social participativo e popular, como bem pondera Paulo Afonso Garrido de Paula[8], para quem o Estatuto da Criança e do Adolescente ao dispor sobre a responsabilidade social através da regulamentação das “formas de democracia participativa ao instituir conselho de direitos e tutelares, redefiniu a política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, enunciando suas linhas de ação e diretrizes.”. Em conclusão, é possível dizer que as decisões tomadas pelos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, através de deliberações democráticas (paritárias e plurais), constituem-se em resoluções, e, não, meramente, em deliberações em si, pois projetam seus efeitos para além do âmbito administrativo-funcional de tais Conselhos, vinculando, então, as “ações em todos os níveis”, haja vista que são órgãos controladores das políticas públicas de atendimento que se operem pelo “conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais.”.
[1] DEL-CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara e OLIVEIRA, Thales Cezar. Estatuto da criança e do adolescente. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 114-118. (Série Leituras Jurídicas: provas e concursos; v. 28). De acordo com os Autores, “essa distribuição cria uma relação de hierarquia e complementaridade entre os entes públicos e a sociedade civil. Hierarquia porque para a União fica a tarefa de emitir as normas gerais e coordenar a política de atendimento aos direitos do menor; (sic) aos Estados o apoio técnico e financeiro aos Municípios; e para estes últimos, a concretização dos programas de atendimento e apoio ao menor (sic). Complementaridade porque existe uma relação de interdependência dos entes governamentais entre si e deles para com a sociedade, sem a qual nenhuma política efetiva poderia ser implementada.”.
[2] SILVA, Antônio Fernando do Amaral; MENDEZ, Emílio Garcia; e CURY, Munir. Estatuto da criança e do adolescente comentado. 4ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 271-281. Em comentários, anota-se que o art. 204 da Constituição da República de 1988 “institui três princípios para essa forma participativa da formulação política: 1) o princípio da deliberação – ou seja, as esferas governamental e não governamental adotarão, conjuntamente, deliberações acerca de como se aplicará o art. 227 da CF, no seu âmbito de atuação (municipal, estadual ou federal), tendo como normas gerais de sua conduta o Estatuto. O Conselho não pode deliberar sobre matéria privativa de outros âmbitos da Administração Pública. Juridicamente, só tem poderes para agir nos limites das normas estatutárias; 2) o princípio do controle da ação – por este princípio, governo e sociedade também se unem para comparar as ações levadas a efeito em torno da criança e do adolescente com as normas gerais presentes no Estatuto e verificar se há desvio. Havendo, deliberam formas, meios e modos para sua correção. Trata-se, portanto, de um moderno mecanismo social de retroalimentação, que busca a eficácia da norma; 3) o princípio da paridade – a junção de dois atores sociais coletivos, governante e governado, para deliberar sobre políticas e controlar ações delas decorrentes não teria o caráter de freio ao arbítrio, nem de contrapeso ao desvio da norma, se não se lograsse equilibrar a balança.”.
[3] MARÇURA, Jurandir Norberto; CURY, Munir e PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Estatuto da criança e do adolescente anotado. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 82. De acordo com os autores, as “deliberações emanadas desses órgãos possuem força normativa, vinculando a vontade do Administrador Público, nos respectivos níveis de atuação (federal, estadual e municipal).”.
[4] BRASIL, STJ – Resp. 493.811/SP (2002/01696619-5) – Segunda Turma – Rel. Min. Eliana Calmon – por maioria – j. em 11.11.2003 – DJ 15.03.2004, p. 236.
“ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO: NOVA VISÃO. 1. Na atualidade, o império da lei e o seu controle, a cargo do Judiciário, autoriza que se examinem, inclusive, as razões de conveniência e oportunidade do administrador. 2. Legitimidade do Ministério Público para exigir do Município a execução de política específica, a qual se tornou obrigatória por meio de resolução do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. 3. Tutela específica para que seja incluída verba no próximo orçamento, a fim de atender a propostas políticas certas e determinadas. 4. Recurso especial provido. (...) a demanda visa unicamente o cumprimento de imperativo legal em consonância com deliberação normativa emanada do Conselho Municipal, cujas determinações vinculam a vontade do administrador público (art. 88, II do ECA) e que, por isso, não é o autor ou o Judiciário que pretendem determinar que o Prefeito, na elaboração das futuras leis orçamentárias, destine recursos suficientes para a execução de projeto destinado ao tratamento da drogadição de crianças, adolescentes e respectivos pais, mas sim a Constituição Federal, o ECA e o próprio Conselho Municipal. (...) implementação de um programa adredemente estabelecido por um órgão do próprio município, o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, com função normativa fixada em conjugação com o Estado (Município) e a sociedade civil. (...) a) inserção em plano plurianual e na lei orçamentária anual, com destinação privilegiada de recursos públicos para o programa; b) observância da Resolução 4/97 e das Constituições, Federal e Estadual e da Lei Orgânica do Município; e c) inclusão no orçamento de previsão de recursos à implementação do programa de atendimento aos viciados, nos termos do projeto. (...) A posição do TJ/SP deixa a reboque do Executivo Municipal fazer ou não fazer o determinado pelos seus órgãos, pela Lei Orgânica e pela Constituição, bastando, para o non facere, escudar-se na falta de verba. Se não havia verba, porque traçou ele um programa específico? Para efeitos eleitoreiros e populares ou pela necessidade da sociedade local? O moderno Direito Administrativo tem respaldo constitucional suficiente para assumir postura de parceria e, dessa forma, ser compelido, ou compelir os seus parceiros a cumprir os programas traçados conjuntamente. Com essas considerações, dou provimento ao recurso especial para julgar procedente em parte a ação ministerial, determinando seja reativado em sessenta dias o programa constante da Resolução 4/97, devendo ser incluído no próximo orçamento Municipal verba própria e suficiente para atender ao programa.”.
[5] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 15ª ed. São Paulo: RT, 1990, p. 81-84. Para o Autor, a publicidade é um dos princípios básicos da atividade administrativa, pois, trata-se de “divulgação oficial do ato para conhecimento público e início de seus efeitos externos. (...) para adquirirem validade universal (...) é requisito de eficácia e moralidade. (...) Em princípio, todo ato administrativo deve ser publicado, porque pública é a Administração que o realiza (...) visa propiciar o seu conhecimento e controle pelos interessados diretos e pelo povo em geral (...) A publicidade, como princípio de administração pública (Const. Rep., art. 37, caput), abrange toda atuação estatal, não só sob o aspecto da divulgação oficial de seus atos como também de apropriação de conhecimento da conduta interna de seus agentes.”.
[6] MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit. O Autor esclarece que a “publicação que produz efeitos jurídicos é a do órgão oficial da Administração, e não a divulgação pela imprensa particular, pela televisão ou pelo rádio, ainda que em horário oficial. Por órgão oficial, entende-se não só o Diário Oficial das entidades públicas, como também os jornais contratados para essas publicações oficiais.”.
[7] ARENDT, Hannah. A condição humana. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997.
[8] PAULA, Paulo Afonso Garrido. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional diferenciada. São Paulo: RT, 2002, p. 50 e 51. Segundo o Autor, com as “inovações introduzidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, anote-se que prescreveu responsabilidade social ao conjunto das pessoas físicas e jurídicas, disciplinando a tutela preventiva, destinada a atalhar a ocorrência de ameaça e violação aos direitos da criança e do adolescente, impondo a todos o dever de respeitar, quando do fornecimento de informação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos, produtos e serviços, a condição peculiar de pessoas em processo de desenvolvimento. Regulamentou formas de democracia participativa ao instituir conselhos de direitos e tutelares, redefiniu a política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, enunciando suas linhas de ação e diretrizes.”.

Repúdio à Responsabilização Penal de Adolescentes Infratores

A responsabilização penal de adolescentes infratores, por suas graves conseqüências sociais à juventude brasileira, deve ser repudiada constitucional, humanitária e democraticamente. A falta de conseqüência sociologizante da responsabilização penal juvenil, visceralmente, expõe a funcionalidade meramente utilitarista desta estratégia jurídico-política apenas comprometida com o inadequado oferecimento de soluções imediatistas, que, a qualquer preço pouco se importa com a possibilidade de vitimização da adolescência enquanto matéria prima da sociedade brasileira. A aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 20, de 1999, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Congresso Nacional, é um retrocesso nas conquistas civilizatórias e humanitárias em prol da infância e da juventude, quando, não, ofende substancialmente o primado da proteção integral consignado no art. 227, da Constituição da República de 1988, senão, o direito individual de cunho fundamental preceituado no subseqüente art. 228, daquela Constituição.
A redução da idade de maioridade penal para 16 (dezesseis) anos circunscreve-se no marco sensacionalista que, diante da opinião pública, ilusoriamente produz o falso sentimento de segurança para contenção da violência urbana. Contudo, tal desordem social não será solucionada pela simples mutação legislativa que pretende reduzir a idade de maioridade penal. De outro lado, tais escolhas políticas possibilitam a legitimação da inação funcional do Poder Público no (des)atendimento das necessidades sociais vitais. Pois, é certo que tais medidas legislativas de caráter meramente repressivo-punitivo não reduzirão, como nunca reduziram, sequer, minimamente, a violência estrutural – isto é, a miséria, o desemprego, a falta de apoio institucional às famílias, a corrupção (“mensalões”, “sanguessugas”, “apagões aéreos”, “operação furacão”, etc.) –, na qual se encontra histórico e culturalmente mergulhada a família, a sociedade e o Estado brasileiro.
Essas exemplificativas espécies de condutas delituosas, por certo, jamais podem ser praticadas por adolescentes, contudo, apesar de suas graves conseqüências sociais, não se categorizam penalmente pela hediondez, mas, certamente, expõem crianças e adolescentes à mendicância, à pivetização e à prostituição infanto-juvenil, haja vista que lhes subtraem a prioridade absoluta na destinação orçamentária de recursos públicos. Os institutos jurídico-penais não servem para educar adolescentes infratores, pois não lhes agrega valores (humanitários) para convivência social livre, justa e solidária, isto é, para o respeito e a responsabilidade pelos outros cidadãos. A disfunção das medidas legais privativas de liberdade nas experiências jurídico-penais sempre dessocializaram as pessoas criminalizadas, marginalizando-as através da exclusão da convivência familiar e comunitária, senão, também hoje as expulsando socialmente dos lugares públicos para o exercício da cidadania plena. A proposição teórico-ideológica da Doutrina da Proteção Integral adotada por opção política pelo Constituinte de 1987-1988, e, operacionalizada legislativamente pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, procura mudar a concepção cultural acerca dos adolescentes infratores não só a partir da compreensão da opinião pública acerca do fenômeno infracional, mas, principalmente, do senso comum jurídico, procurando, assim, ensejar outras posturas institucionais (estatais) e organizacionais (comunitárias), em prol de uma nova proposta socioeducativa caracteristicamente humanitária. É preciso ter capacidade de se indignar e resistir civilmente aos avanços do binômio funcionalista-utilitarista de cunho repressivo-punitivo de um Direito Penal inconseqüente socialmente, o qual não tem qualquer compromisso com a melhoria da qualidade de vida individual ou comunitária do adolescente, da vítima e de suas respectivas famílias. A não responsabilização penal dos adolescentes infratores, enquanto direito individual de cunho fundamental, constitui-se, sim, em cláusula pétrea, segundo o inc. IV, do § 4º, do art. 60, da Constituição da República de 1988, senão, patrimônio personalíssimo reconhecido à infância e à juventude por alinhamento às Convenções Internacionais dos Direitos da Criança, as quais são fontes de lei, no Brasil, consoante o § 2º, do art. 5º, da Magna Carta brasileira.

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

17 Anos do Estatuto da Criança e do Adolescente

A Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) nesta sexta-feira completa dezessete (17) anos de vigência, contudo, ainda precisa e por isso mesmo é dependente de emancipação cultural, ideológica, política e social, isto é, de que se estabeleçam pautas públicas que adotem dentre suas temáticas os assuntos de interesse da infância e da juventude para a implementação efetiva dos melhores e superiores interesses desses novos cidadãos. Aos dezessete (17) anos do Estatuto é possível dizer que já se consagrou, no Brasil, a doutrina da proteção integral como marco teórico-pragmático que serve como orientação para todas as ações governamentais e não-governamentais que se realizam em prol da criança e do adolescente. Entretanto, é possível observar em inúmeros núcleos familiares, em diversos segmentos sociais e em todos os níveis de governo que muito ainda deve ser feito.
A doutrina da proteção integral enquanto programa de ação deve continuar vinculando as proposições legislativas e as atividades administrativas adotadas pelos gestores públicos assim como as medidas judiciais, pelo maior tempo possível, senão, o que for necessário para a (re)organização social e política da Nação brasileira (re)estruturando funcionalmente as intervenções estatais (Poder Público) para a (re)democratização das relações sociais que se desenvolvem comunitariamente na promoção e defesa dos direitos fundamentais afetos à infância e à juventude. A doutrina da proteção integral se constitui num programa de ação – seja como princípio, seja como teoria – que assegura com absoluta prioridade os direitos individuais e as garantias fundamentais inerentes à criança e ao adolescente enquanto sujeitos de direito, isto é, cidadãos que merecem dedicação protetiva diferenciada e especial por distinção constitucional decorrente de opções políticas civilizatórias e humanitárias.
Os direitos humanos então objetivados constitucionalmente como fundamentais, aqui, com destinação especial para a infância e a juventude são decorrentes de políticas que se alinharam às diretrizes internacionais estabelecidas por valores humanitários – ainda que ocidentalizados – configurando, assim, substancialmente a concepção aberta (noção ou idéia) do que se possa entender por proteção integral dos interesses, dos direitos e das garantias afetos à criança e ao adolescente, ou seja, de tudo aquilo que é fundamental e mais comezinho para a promoção e defesa das liberdades públicas desses novos cidadãos (ação positiva e propositiva) ao mesmo tempo em que se impede com isso todo e qualquer tipo de ameaça e violência atentatórias (ações negativas e limitativas) àquelas liberdades substanciais.
O Estatuto da Criança e do Adolescente e a Constituição da República de 1988 constituem-se, por isso, nas “Leis de Regência” fundadas teórico-pragmaticamente na doutrina da proteção integral (superior e melhor interesse da criança e do adolescente) determinantes jurídico, social e politicamente para priorização absoluta do atendimento das questões inerentes à infância e à juventude, delimitando, assim, a atuação do Poder Público na formulação das políticas sociais públicas que se destinem ao atendimento de tais demandas – como, por exemplo, a destinação privilegiada de recursos públicos.
O Estatuto da Criança e do Adolescente tanto quanto a Constituição da República de 1988 assinalam a atuação política dos gestores públicos, dos conselhos de direitos, dos conselhos tutelares, dos operadores do direito, enfim, de todos aqueles que desenvolvem atividades em prol da infância e da juventude, compondo, por assim dizer, rede de atendimento direto e indireto, rede de proteção e sistema de garantias. Entretanto, os mencionados atores (transformadores) sociais não devem se limitar ao cumprimento, senão, à mera desoneração de suas funções jurídicas e ou sociais legalmente estabelecidas, mas, acima de tudo, devem procurar participar ativa e decisivamente na comunidade em que vivem – ocupando, pois, democraticamente a espacialidade pública da palavra e da ação[1].
A democracia contemporânea exige a superação do princípio da igualdade, emancipando-se para ambiência sócio-político participativa, paritária, comunitária e plural. Pois, uma tal experiência democrática forjou e deve continuar forjando a atuação, permanência e conquistas de outras espacialidades públicas para o exercício democrático e paritário da palavra e da ação, como, por exemplo, os Conselhos dos Direitos e os Conselhos Tutelares enquanto novas expressões paritárias da também jovem democracia brasileira.
Os Conselhos dos Direitos e os Conselhos Tutelares para além de se constituírem em novas categorias jurídico-legais com atribuições legais, sociais e políticas definidas no Estatuto da Criança e do Adolescente – e por decorrência de previsão estatutária também através das resoluções deliberadas pelos Conselhos dos Direitos, aqui, em especial, o Nacional (CONANDA)[2] – devem desenvolver importantes transformações valorativas através de suas múltiplas intervenções legalmente previstas.
Nestes dezessete (17) anos do Estatuto da Criança e do Adolescente conquistas e avanços significativos foram alcançados ensejando a assunção de compromissos angariados democraticamente, no entanto, agora é hora de maiores investimentos públicos na definição de uma política orçamentária participativa e permanente que viabilize a implementação efetiva dos direitos fundamentais afetos à criança e ao adolescente que possibilite a realização de políticas sociais públicas que propiciem não só a efetivação daqueles direitos fundamentais[3], mas, que, também ofereçam apoio institucional aos núcleos familiares.
A efetivação dos direitos fundamentais afetos à criança e ao adolescente para além de vitalizar as “Leis de Regência”, isto é, a Constituição da República de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente, também, vitaliza a própria democracia e a cidadania infanto-juventil, pois o “reconhecimento da dignidade da pessoa, na inviolabilidade dos direitos e no livre desenvolvimento da personalidade”, certamente, constituem-se em expressões significativas de um Estado, “como organização jurídico-política por excelência das sociedades civilizadas”, segundo José Alfredo de Oliveira Baracho[4], que se pretende democrático (Constitucional[5]) e de Direito.
É preciso investimentos estruturais na educação infantil, principalmente, na construção e manutenção de creches e na contratação de pessoal capacitado – capacitação permanente, então, concebida como troca de experiências e renovação ideológica pelo reconhecimento dos valores humanos. É preciso investimentos públicos humanitários, orçamentários, políticos na construção, implementação e manutenção dos Centros de Atenção Psicossocial Infanto Juvenil – CAPsi; e dos Centros de Atenção Psicossocial aos Usuários Abusivos de Álcool e Drogas – CAPsad; destinados ao atendimento de crianças e adolescentes que tiverem sofrimento mental grave. Conquanto, importa ressaltar que a reforma psiquiátrica, no Brasil, opera-se a partir de dois princípios fundamentais, quais sejam: antimanicomial e antihospitalicêntrico, pois, com isso, realiza-se também a (re)democratização nas relações sociais em que se inserem pessoas cujo direito à saúde mental (psíquica) – além é certo da física e social – para além de ser assegurado e efetivado, principalmente, deve evitar toda e qualquer hipótese de exclusão social[6].
Enfim, é preciso investimentos preferenciais na formulação e execução de políticas sociais públicas, com destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude – alíneas “c)” e “d)”, do § único do art. 4º do Estatuto – que sejam independentes das circunstanciais e sazonais governabilidades e de suas “razões de Estado” que não se inclinem per lege às diretrizes constitucionais e estatutárias consubstanciadas na doutrina da proteção integral cuja prioridade é absoluta. Ademais, pontue-se que todo e qualquer imperativo legal deve ter ampla publicidade, em decorrência mesmo da exigência ético-política de transparência[7] administrativa que se impõe para o tratamento de assuntos cujos interesses pertence a todos.
A criança e o adolescente não podem mais ser tratados como “problema de polícia” (atos desviados) “ou de assistência caritativa” (abandono), segundo Luigi Ferrajoli[8], para quem as condições de pobreza e marginalidade empurram aqueles novos cidadãos para uma relação adulta com a sociedade através da exploração do trabalho ilegal, da exploração sexual comercial infanto-juvenil, senão, pela “pequena criminalidade de subsistência”. O Estatuto da Criança e do Adolescente ao longo desses dezessete (17) anos reformulou não só a legislação referente aos interesses, direitos e garantias afetos à infância e à juventude, mas, também operou transformações valorativas fundamentais nas relações sociais (relações de poder) entre aquelas pessoas que se encontram na condição peculiar de desenvolvimento, as famílias, a comunidade e o poder público, em todos os níveis.
O direito da criança e do adolescente materializou-se na Constituição da República de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente, passando, então, a reformular as antigas relações naturalistas entre a infância e a juventude, e, o ordenamento jurídico brasileiro até então de cunho espontaneamente afetivo e tutelar, para a emancipação civilizatória e humanitária politicamente inscrita no reconhecimento constitucional da força vinculante das diretrizes internacionais (lógica) dos direitos humanos destinados especificamente às pessoas que se encontram na condição peculiar de desenvolvimento da personalidade, quais sejam: crianças e adolescentes. O Estatuto da Criança e do Adolescente ao fazer dezessete (17) anos se encaminha para a “maioridade” temporal legislativa (vigência legal) impondo-se, assim, também amadurecer político e ideologicamente para concreção de seus preceitos jurídico-legais que se fundam nos valores humanos agregados constitucional e estatutariamente à ordem jurídica brasileira na defesa dos interesses, dos direitos e das garantias fundamentais da criança e do adolescente, pois, com isto, será possível alcançar a mais ampla eficácia jurídica e social.
O Estatuto da Criança e do Adolescente cuja validade constitucional é alinhavada à mutação da perspectiva humanitária, certamente, levou a sério a Convenção Internacional dos Direitos da Criança estabelecendo, assim, uma nova “lógica dos direitos e suas garantias”, a qual não pode mais sucumbir frente à “lógica da força do mercado”, segundo Luigi Ferrajoli[9]. As suas inúmeras temáticas que por suas complexidades exigem dedicação aprofundada e, por vezes, contribuições distintas da atuação meramente jurídica, técnica ou teórica. Neste sentido, a legislação estatutária prevê que uma das suas principais diretrizes políticas é a mobilização social, isto é, a mobilização da opinião pública no sentido da indispensável participação paritária dos diversos segmentos da sociedade – consoante inc. VI, do seu art. 88 –, principalmente, na formulação das políticas sociais públicas que requerem destinação privilegiada de recursos públicos para a formatação orçamentária específica.
A valorização desta ainda jovem legislação que regulamenta a responsabilidade familiar, comunitária e estatal acerca das condições mínimas de dignidade das crianças e adolescentes requer, assim, tanto a proteção (defesa) dos direitos afetos àquelas cidadanias, quanto a promoção (veiculações propositivas) dos valores humanitários que são inerentes à própria dignidade daquelas pessoas que se encontram na condição peculiar de desenvolvimento.
Importantes conquistas e avanços já foram alcançados ao longo dos dezessete (17) anos de vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente na efetivação dos direitos afetos à infância e à juventude, contudo, é preciso ainda que se implementem não só regras jurídico-legais humanitárias, mas, principalmente, aquelas que se destinem preferentemente à construção (formulação), implementação (execução) e manutenção de políticas sociais públicas sérias e permanentes, as quais demandam a destinação absolutamente prioritária de recursos públicos através de dotações orçamentárias vinculadas constitucional e estatutariamente tanto ao recolhimento (receita) quanto à aplicação (despesas) de tais recursos.
Pois, somente assim será possível consignar no marco legislativo um programa de ação que assegure na Lei de Diretrizes Orçamentárias uma destinação privilegiada de receitas públicas para as “áreas relacionadas com a proteção da infância e à juventude”, consoante as alíneas “c)” e “d)”, do parágrafo único (garantia da prioridade), do art. 4º, da Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).
Até porque, antes mesmo de que se possa pensar em novos investimentos públicos na área da educação, da saúde, da assistência social dentre tantas outras questões estruturais, afigura-se como fundamental o estabelecimento de um orçamento específico, participativo, permanente e prioritariamente destinado ao atendimento dos interesses, direitos e garantias individuais de cunho fundamental da criança e do adolescente, construindo, por assim dizer, “uma decidida política dos gastos públicos”, segundo Luigi Ferrajoli[10], em prol da infância e da juventude.
O desenvolvimento teórico e civilizatório (ideológico) alinhado às práticas propositivas (ações e experiências humanitárias) proporcionaram o rompimento legislativo (político) e social com o regime legal anterior então fundado na perspectiva da “situação irregular” – “Código de Menores”, Lei Federal nº 6.697, de 10 de outubro de 1979 expressamente revogada pelo art. 267, do Estatuto da Criança e do Adolescente – através mesmo da assunção do marco teórico-pragmático denominado de “doutrina da proteção integral” que assegura, com absoluta prioridade, os direitos fundamentais (valores humanos) afetos à criança e ao adolescente. A denominada doutrina da proteção integral estrategicamente consagra institutos, categorias, sistemas e metodologias assecuratórias destinadas ao integral cumprimento e efetivação daqueles direitos fundamentais constitucional e estatutariamente garantidos, mediante a destinação privilegiada de recursos públicos – dotações orçamentárias priorizadas para a infância e a juventude – que, na verdade, determinam “mudança comportamental orçamentária assim como um severo fiscalizar do destino das dotações orçamentárias”, segundo Liborni Siqueira[11].
Eis, pois, a revolução jurídico-legal[12], ideológica, política e social que se implementa diuturnamente não só em prol da criança e do adolescente, mas, principalmente, para a concreção e reconhecimento dessas novas cidadanias que exigem uma ampla e irrestrita (re)democratização das relações sociais, senão, das próprias instâncias públicas de poder, preservando-se, assim, a identidade infanto-juvenil como a matéria prima das presentes e futuras sociedades brasileiras. O Estatuto da Criança e do Adolescente nesses dezessete (17) anos de vigência se constitui muito mais do que uma simples legislação formal, haja vista que se consagrou verdadeiramente num projeto jurídico para construção da democracia, pois cuidou não só da regulação das relações sociais em que se inseriam os interesses, direitos e garantias da criança e do adolescente, mas, também, projetou importantes transformações na realidade do mundo da vida vivida.
Enfim, o Estatuto da Criança e do Adolescente constitui-se, por assim dizer, num projeto de democracia – “uma construção ao mesmo tempo racional e social”, segundo Luigi Ferrajoli[13] – destacadamente para a consolidação da cidadania infanto-juvenil realizável, pois, através do respeito e a responsabilidade familiar, comunitária e estatal (poder público) para com a dignidade daquelas pessoas que se encontram na condição peculiar de desenvolvimento, quais sejam: crianças e adolescentes. Assim como a Constituição da República de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente, também, não se substitui à política, mutatis mutandis como bem observa Eros Roberto Grau[14], para quem aquelas “Leis de Regência” devem sujeitar na área jurídico-legal destinada à infância e à juventude a política à fundamentação constitucional e estatutária, pois, certamente, nisso residiria a força vinculativa da “doutrina da proteção integral” ideológica, constitucional e estatutariamente adotada, “com vinculação das políticas públicas a ela.”.
O desafio, hoje, da legislação estatutária é se converter num sentido comum politicamente compartilhado pelos diversos segmentos sociais, parafraseando, assim, Luigi Ferrajoli[15], para quem as condições de efetividade do Estatuto da Criança e do Adolescente “dependem da medida na qual o direito e os direitos se convertem – através do diálogo, do confronto racional e da firmeza em sua defesa – em sentido comum socialmente compartilhado, fincado na cultura popular e nas práticas sociais e políticas.”. As resoluções jurídicas (judicial) ou políticas (legislativa) acerca de questões relativas aos direitos fundamentais afetos à criança e ao adolescente, com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente, passaram a exigir procedimentos especiais para discussão, elaboração e implementação das medidas legais a serem adotadas jurídica e politicamente através de esforços teóricos e pragmáticos que estabeleçam uma nova racionalidade baseadas em argumentos dedutíveis dos primados constitucionais sistematizados estatutariamente.
Com isso, procura-se interromper deduções lógico-formais que se afastem da sistematização constitucional-estatutária, evitando-se, assim, a utilização indevida de institutos, categorias e elementos alógicos[16] àquela sistemática jurídico-protetiva de caráter insofismavelmente humanitário. O desafio hermenêutico que se propõe agora é a de lealdade estatutária, isto é, de uma interpretação das novas regras, institutos e categorias estabelecidas no Estatuto da Criança e do Adolescente que se coadune com a orientação humanitária consignada na doutrina da proteção integral, reforçando, assim, a proposição teórico-pragmática constitucional com as normas concretas inseridas nessa nova legislação estatutária, através da articulação com a realidade social concreta[17].
Conquanto, não se pode olvidar que o mundo vivido pelas crianças e adolescentes, no Brasil, como bem ressalta Ricardo Nery Falbo[18], lamentavelmente, ainda é muito diferenciado do que aquele concebido nas “Leis de Regência” e na decorrente construção jurisprudencial.
Que, em breve, o Estatuto da Criança e do Adolescente se encaminhe não só para a maturidade legislativa (vigência), mas, também para a maturidade cultural, ideológica, política e social, transformando-se assim num direito maior na constelação legislativa do ordenamento jurídico brasileiro. Pois, certamente, o Estatuto da Criança e do Adolescente possui a capacidade e a potência de realizar “uma verdadeira educação na legalidade”[19], isto é, através de regras humanitárias que se orientem pelo respeito e responsabilidade para com a matéria prima da presente e futura sociedade brasileira: a infância e a juventude.
[1] ARENDT, Hannah. A condição humana. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997.
[2] BRASIL, Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Resoluções nº 105, 106 e 116.
Resolução nº 105, de 15 de junho de 2005 – Dispõe sobre os Parâmetros para Criação e Funcionamento dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e dá outras providências.
Resolução nº 106, de 17 de novembro de 2005 – Altera dispositivos da Resolução Nº 105/2005 que dispõe sobre os Parâmetros para Criação e Funcionamento dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e dá outras providências.
Resolução nº 116, que altera dispositivos das Resoluções Nº 105/2005 e 106/2006, que dispõe sobre os Parâmetros para Criação e Funcionamento dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e dá outras providências.
[3] RAMIDOFF, Mário Luiz. Lições de direito da criança e do adolescente: ato infracional e medidas socioeducativas. Curitiba: Juruá, 2005, p. 30 e ss. Pontua-se que “somente através do deslocamento da perspectiva jurídica racional lógico-dedutiva para uma perspectiva da discursividade transdisciplinar e afetiva, ou seja, para também perceber a realidade que lhe circunstancia, será possível (re)conquistar as condições de possibilidade do exercício dos direitos mais comezinhos da personalidade, ao que se denomina de cidadania.”.
[4] BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Teoria geral da cidadania: a plenitude da cidadania e as garantias constitucionais e processuais. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 61 e ss. Para o Autor, mutatis mutandis, legislações como essas “além da enunciação dos princípios fundamentais, que precedem os direitos e deveres dos cidadãos, procuram promovê-los, através de certas garantias, que não se restringem apenas às iniciativas judiciais dos titulares de situações jurídicas subjetivas, mas supõem o compromisso de todos os órgãos dos poderes públicos para que todos se tornem funcionalmente efetivos. (...) Os conflitos políticos e jurídicos são resolvidos pela correta interpretação dos direitos fundamentais, tornando possível concretizar os enunciados contidos na Constituição, compatibilizando todos eles, para que possam efetuar as garantias que os tornam aplicáveis. A prática das garantias constitucionais, para a efetivação dos direitos inscritos de maneira positivada, está vinculada à interpretação da Constituição e dos valores superiores deferidos pelo texto básico.”.
[5] CADEMARTORI, Sérgio Urquhart de. Estado de direito e legitimidade: uma abordagem garantista. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.
[6] FOUCAULT, Michel. Doença mental e psicologia. 6ª ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2000, p. 71 a 74 (Biblioteca Tempo Universitário, 11). Segundo o Autor, “uma sociedade se exprime positivamente nas doenças mentais que manifestam seus membros; e isto, qualquer que seja o status que ela dá a estas formas mórbidas: que os coloca no centro de sua vida religiosa como é freqüentemente o caso dos primitivos, ou que procura expatriá-las situando-os no exterior da vida social, como faz nossa cultura. Duas questões se colocam então: como chegou nossa cultura a dar à doença o sentido do desvio, e ao doente um status que o exclui? E como, apesar disso, nossa sociedade exprime-se nas formas mórbidas nas quais recusa reconhecer-se?”.
[7] VIANNA, Túlio. Transparência pública, opacidade privada: o direito como instrumento de limitação do poder na sociedade de controle. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p. 208 e ss. Segundo o Autor, “o direito como instrumento de limitação do poder na sociedade de controle deve fundar-se em duas premissas fundamentais: a transparência pública, entendida como a máxima publicidade dos atos de interesse público, e a opacidade privada, entendida como a máxima confidenciabilidade dos atos da esfera privada.”.
[8] MÉNDEZ, Emílio García e BELOFF, Mary (orgs.). Infância, lei e democracia na América Latina: análise crítica do panorama legislativo no marco da convenção internacional sobre os direitos da criança 1990-1998. vol. 1. Blumenau: edifurb, 2001, prefácio.
[9] MÉNDEZ, Emílio García e BELOFF, Mary (orgs.). Op. cit. De acordo com o Luigi Ferrajoli, “esta transformação – da tutela paternalista e autoritária à garantia dos direitos, do velho regime de ‘compaixão-repressão’ como foi chamado por Emilio García Méndez, à cidadania da infância – se traduz em uma nova dimensão constitucional do direito da infância”.
[10] MÉNDEZ, Emílio García e BELOFF, Mary (orgs.). Op. cit.
[11] SIQUEIRA, Liborni (coord.). Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. Rio de Janeiro: Forense, 1991.
[12] RAMIDOFF, Mário Luiz. Op. cit.
[13] MÉNDEZ, Emílio García e BELOFF, Mary (orgs.). Op. cit.
[14] COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda (org.). Canotilho e a constituição dirigente. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. Adverte Eros Roberto Grau que “uma das pautas que pronunciadamente concorre para limitar o elenco das soluções corretas a que pode chegar o intérprete da Constituição é a da ideologia constitucional. O direito – e, muito especialmente, a Constituição – é não apenas ideologia, mas também nível no qual se opera a cristalização de mensagens ideológicas. Por isso que as soluções de que cogitamos somente poderão ser tidas como corretas quando e se adequadas e coerentes com a ideologia constitucionalmente adotada.”.
[15] MÉNDEZ, Emílio García e BELOFF, Mary (orgs.). Op. cit.
[16] MOURULLO, Gonzalo Rodríguez. Aplicación judicial del derecho y lógica de la argumentación jurídica. Madrid: Cívitas, 1988, p. 29 e ss (Cuadernos Cívitas).
[17] FALBO, Ricardo Nery. Natureza do conhecimento jurídico: generalidade e especificidade no direito da criança e do adolescente. Porto Alegre: Safe, 2002, p. 187 e ss. Eis, pois, a advertência do Autor, “o Estatuto da Criança e do Adolescente, de promulgação recente à época da realização deste trabalho (...) não apresenta articulação com aspectos relevantes dessa realidade social, embora parecesse oferecer condições bastante favoráveis de aproximação com a sociedade.”.
[18] FALBO, Ricardo Nery. Op. cit.
[19] MÉNDEZ, Emílio García e BELOFF, Mary (orgs.). Op. cit. De acordo com o Luigi Ferrajoli, “uma verdadeira educação na legalidade, ou seja, com respeito às regras, se obtém sobretudo respeitando o adolescente”.

Preservação da Identidade da Criança e do Adolescente Infrator

A Lei Federal 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) considera criança a pessoa até doze (12) anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze (12) e dezoito (18) anos de idade. Ademais, o mencionado Estatuto também preceitua que a criança que praticar ato infracional (art. 105) será submetida a medidas legais específicas de proteção previstas no seu art. 101. Já o adolescente que cometer um comportamento conflitante com a lei será submetido a medidas socioeducativas previstas no art. 112 a 125, do Estatuto, para além da possibilidade de aplicação cumulativa das mencionadas medidas legais específicas de proteção.
Entretanto, ao longo da investigação, apuração e aplicação das mencionadas medidas legais tanto à criança quanto ao adolescente que cometeu ato infracional é imperativo a preservação de identidade, imagem, e, sobremodo, da sua própria pessoa, assegurando-lhe de qualquer meio evasivo de comunicação que, sem autorização legal, veicule informações, nomes, atos, documentos, fotografias e ilustrações que possibilitem a identificação dos infantes e dos jovens envolvidos num acontecimento infracional.
O art. 247 do Estatuto da Criança e do Adolescente tem por objetivo precípuo a proteção integral da identidade da criança e do adolescente que cometem comportamento conflitante com a lei, buscando com isso preservar não só seus nomes ou suas imagens, mas principalmente as suas próprias pessoas, pois se encontram na condição peculiar de desenvolvimento – nos termos do que dispõe o art. 6º, daquele Estatuto[1].
O mencionado preceito estatutário, na verdade, não se preocupa tanto com a regulamentação das atividades dos meios de comunicação social – “de massa”, segundo Jean Baudrillard[2] –, mas principalmente com a proteção integral dos direitos individuais de cunho fundamental, inerentes à personalidade da criança e do adolescente que cometeram condutas contrárias à lei.
As informações acerca do nome, acontecimento, fotografia, ilustração ou documentação inerente a procedimento policial, administrativo ou judicial relativo à criança ou ao adolescente a que se atribua o cometimento de ato infracional, permitindo, assim, suas identificações direta ou indiretamente, para além de servir propositalmente à moralização social mantendo, assim, “as massas sob o sentido” – pois “elas querem espetáculo”, segundo Jean Baudrillard[3] –, em pior medida, esvazia a potencialidade de transformação humanitária que tanto a seriedade do conteúdo das circunstâncias existências, quanto à seriedade protetiva do Estatuto da Criança e do Adolescente.
É preciso ter cuidado com as informações acerca da criança e do adolescente infrator, uma vez que aquelas não podem ser divulgadas total ou parcialmente, sem autorização devida, por qualquer meio de comunicação, pois, com isso, procura-se evitar que tais informações se transformem em meras mensagens[4] estereotipadas de uma seqüência espetacular da barbárie, então, mistificadas pela exigência hipócrita de “transparência pública” – mutatis mutandis, é a diretriz protetiva sugerida por Túlio Vianna[5].
A “transparência pública” deve ceder lugar à proteção integral da criança e do adolescente que se envolveram num evento infracional, haja vista que a sua vulnerabilidade material decorrente da condição peculiar de desenvolvimento se acentua com o próprio cometimento de condutas conflitantes com a lei, consoante tem descrito Graciela Sandoval Vargas e Edgar Corzo Sosa[6], os quais têm destacado que “es de suma importancia la garantía y el respeto a los derechos de las personas que por su condición y circunstancias personales se encuentren en situación de vulnerabilidad, especialmente en el caso de menores de edad; ya que éstos, por su falta de madurez física y psicológica, dificilmente pueden protegerse y cuidarse por sí mismos de actos o ataques que atenten contra su desarrolo integral; su dignidad personal, y su integridad física, psíquica y social.”.
A “transparência pública”, assim, deve se render às limitações destinadas à esfera pública da palavra e da ação[7] que caracterizam um Estado democrático (constitucional[8]) e de direito. A preocupação por isso é anterior, pois, cuida-se da preservação da personalidade humana daquelas crianças e adolescentes e do correlativo direito individual fundamental que importa na não exclusão social, evitando-se, assim, a expulsão comunitária ainda que se opere simbolicamente através de informações diretas e indiretas veiculadas como “simples valor de uso”[9] economicista do social, isto é, pela captação de altos índices de assistência sugestionável[10] (denominada na gíria de “ibope”) para venda de espaços e tempos comerciais destinados à propaganda de serviços e ou de produtos.
Não se impõe aqui a exigência de comprovação da exposição a vexame ou a constrangimento de crianças ou adolescentes – art. 232, do Estatuto – em decorrência mesmo de sua identificação pessoal como autores do comportamento contrário à lei. A objetividade estatutária é precisamente inversa ao valor economicista do social como valor de uso, ou seja, o que se busca é a inclusão, o respeito, o acolhimento, o cuidado, enfim, a proteção integral da criança e do adolescente independentemente do comportamento que tenham praticado. Enfim, impõe-se tanto quanto possível eliminar condições atentatórias à dignidade daquelas pessoas que se encontram na condição peculiar de desenvolvimento da personalidade, reduzindo ao máximo as ameaças e violências às suas integridade física, psíquica e social.
Dentre as medidas legais previstas no art. 247 do Estatuto, destacam-se as previstas no seu § 2º, as quais, para além da reação estatal de cunho repressivo-punitivo (“Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência”), determinam a apreensão da publicação, a suspensão da programação da emissora e também da publicação do periódico.
Os órgãos de imprensa e as emissoras de rádio e de televisão enquanto veículos de comunicação social devem oferecer importantes contribuições para a discussão de questões e temáticas que interessem à coletividade possibilitando, assim, o esclarecimento da opinião pública para que também participe da construção da democracia. Oswaldo Ferreira de Melo[11] entende que para a opinião pública se transformar numa legítima representatividade, por certo, “exige alguns requisitos do ambiente em que se desenvolve, como liberdade de expressão, publicidade dos atos do Governo, do Parlamento e do Judiciário e condição de formação e expressão da cidadania.”.
Neste sentido, Edmundo Oliveira[12] destaca que a legislação estatutária procura preservar “o futuro e o bom conceito da criança e do adolescente a que se atribua ato infracional”, evitando-se, com isso, a execração pública injusta e prejudicial, haja vista que não estão suficientemente formados, senão, que uma tal exposição pública certamente os denegrirá para sempre.
A representação da realidade pela mídia é limítrofe entre a ficção e a realidade, ou seja, “o que é real e o que não é real naquilo que a mídia apresenta?”, segundo Tomás Barreiros[13]. Por isso, a divulgação e ou exibição parcial, total, direta ou indiretamente de nome, ato, documento, fotografia e ilustração, sem autorização devida, de forma a permitir a identificação de criança ou de adolescente que cometeu ato infracional, para além de “contribuírem para criar um efeito de sentido de verdade”[14], vale dizer, aparência de uma verdade, insofismavelmente, depõem culturalmente contra os valores humanitários da matéria prima da futura sociedade brasileira. Isto é, depõem diretamente contra todas as crianças e adolescentes, pois exalta especificamente uma versão montada do “mal” sem jamais se preocupar com o encontro do “bem”.
O art. 143 do Estatuto da Criança e do Adolescente, por isso, proíbe a divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional, impedindo-se, assim, que qualquer notícia a respeito do fato possa identificar a criança ou adolescente, quando, não, “vedando-se fotografia, referência a nome, apelido, filiação, parentesco, residência e, inclusive, iniciais do nome e sobrenome.”.
O “bem” aqui pode ser exatamente a atitude a ser evitada, isto é, a divulgação e ou exibição acima mencionadas, construindo-se, por assim dizer, uma “ética das verdades”, segundo Alain Badiou[15], para quem a “ética combina então, sob o imperativo: ‘Continuar!’, um recurso de discernimento (não se prender aos simulacros), de coragem (não ceder) e de reserva (não se dirigir aos extremos da Totalidade).”.
A Constituição da República de 1988 também resguardou o indispensável sigilo acerca de tais informações ao preceituar no inc. LX do seu art. 5º que “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”, protegendo, inclusive, com isto, “crianças e adolescentes que houvessem sido vítimas”[16] de atos infracionais, crimes e ou de quaisquer outras formas de violência.
Até porque, não se trata aqui de censura ou mesmo restrição limitativa ao exercício do direito à liberdade de expressão, opinião, informação, comunicação, palavra, pois não se proíbe a divulgação da notícia, como bem ressalta Jorge Araken Faria da Silva[17], mas, sim, tem-se a intenção de proteger integralmente a criança e o adolescente dos excessos de publicidade.
A proteção do sigilo das informações acerca da criança e do adolescente que se envolveram num acontecimento infracional, destina-se, assim, a preservar respectivamente as identidades daquelas pessoas que se encontram na condição peculiar de desenvolvimento da personalidade, obstando a exposição estigmatizada e a conceituação preconceituosa que macule a imagem e a reputação não só daqueles infantes e jovens, mas, também de seus respectivos núcleos familiares.
[1] BRASIL, Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente.
Art. 6º. Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
[2] BAUDRILLARD, Jean. À sombra das maiorias silenciosas: o fim do social e o surgimento das massas. Trad. Suely Bastos. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1994, p. 10 e ss.
[3] BAUDRILLARD, Jean. Op. cit. De acordo com o Autor, a grande maioria silenciosa não tem mais história a escrever, pois a sua força atual limita-se ao silêncio “ocultando o desabamento central do sentido com uma recrudescência de todas as significações e com uma dissipação de todos os significantes.”.
[4] BAUDRILLARD, Jean. Op. cit. Para o Autor os meios de comunicação identificam e atendem precisamente os anseios “das massas”, pois “elas ‘farejam’ o terror simplificador que está atrás da hegemonia ideal do sentido e reagem à sua maneira, reduzindo todos os discursos articulados a uma única dimensão irracional e sem fundamento, onde os signos perdem seu sentido e se consomem na fascinação: o espetacular.”.
[5] VIANNA, Túlio. Transparência pública, opacidade privada: o direito como instrumento de limitação do poder na sociedade de controle. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p. 203 e ss. Segundo o Autor, “o princípio da transparência pública veda qualquer monitoração eletrônica ou captura e armazenamento de dados pessoais de caráter secreto. (...) o princípio da transparência pública veda a existência de qualquer banco de dados secretos com informações pessoais e tem como corolário o direito à informação. (...) A autarquia de defesa da privacidade deverá velar na esfera administrativa pela fiel observância do princípio da transparência pública, o que não exclui porém a apreciação do poder judiciário”.
[6] SOSA, Edgar Corzo e VARGAS, Graciela Sandoval. Criterios jurídicos de las recomendaciones de la comissión nacional de los derechos humanos (1990-2005). México: Universidad Nacional Autónoma de México; Comissión Nacional de Derechos Humanos, 2006, p. 9 e ss. (Instituto de Investigaciones Jurídicas, Série Estudios Jurídicos, nº 92).
[7] ARENDT, Hannah. A condição humana. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997.
[8] CADEMARTORI, Sérgio Urquhart de. Estado de direito e legitimidade: uma abordagem garantista. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.
[9] BAUDRILLARD, Jean. Op. cit. O Autor assevera que o “limite do valor economista do social como valor de uso é na verdade o valor ecologista do social como abrigo. (...) Uma espécie de espaço fetal de segurança que provê em toda parte a dificuldade de viver, que fornece em toda a parte a qualidade da vida, isto é, para tal segurança todos os riscos, o equivalente da vida perdida – forma degradada da sociabilidade lubrificante, assistencial, pacificante e permissiva –, a forma mais baixa da energia social: a de uma utilidade ambiental, comportamental – essa é a nossa imagem do social – forma entrópica –, outra imagem de sua morte.”.
[10] ZACHARIAS, Manif. Dicionário auxiliar de composição literária. Florianópolis: Garapuvu, 2006, p. 56. Segundo o Autor, por assistência pode ser entendido o conjunto de espectadores que na concepção literária é sugestionável, crédulo, deslumbrado quando se tratar por característica decorrentes de possíveis correlações adjetivas.
[11] MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas atuais de política do direito. Porto Alegre: Safe; CMCJ-UNIVALI, 1998, p. 23 e ss. O Autor não olvida que a opinião pública para além de seu caráter fenomenológico, também é “uma importante forma de controle social ou seja um elemento considerável da interação social. De qualquer forma, quer considerada como verdade geral, ou como termo de controvérsias, é fenômeno que só pode ser considerado num Estado democrático e pluralista. (...) A opinião pública, por ser fenômeno cultural, tem um caráter relativo, pois muda conforme as circunstâncias que assim o determinam. (...) É em geral produto da informação e, mais que isso, da experiência.”.
[12] SILVA, Antônio Fernando do Amaral, MENDEZ, Emílio Garcia e CURY, Munir (Coords). Estatuto da criança e do adolescente: comentários jurídicos e sociais. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 740 a 743. Eduardo Oliveira comentando o art. 247 do Estatuto esclarece que “para resguardar desses males a criança ou adolescente, a lei proíbe a exibição de fotografia do autor de ato infracional ou de qualquer ilustração (desenhos, pinturas) que lhe diga respeito, desde que possa levar a identificá-lo. Infelizmente, este preceito sempre foi desobedecido e todos os dias se vê estampada em jornais a fotografia do autor do ato infracional, apenas com uma tarja sobre os olhos.”.
[13] BARREIROS, Tomás. Jornalismo e construção da realidade: análise de O “mez da grippe” como paródia crítica do jornalismo. Curitiba: Pós-escrito, 2003, p. 103 e ss.
[14] BARREIROS, Tomás. Op. cit. O Autor assinala que “as notícias, as fotografias, os documentos oficiais e o depoimento da testemunha dos fatos (Dona Lúcia) são apresentados como verdadeiros e contribuem para criar um efeito de sentido da verdade. Entretanto, as contradições internas do depoimento de Dona Lúcia (...) para tomar o leitor de surpresa nessa desmontagem da aparência de verdade do depoimento (...) colocam em xeque a validade do discurso jornalístico, que se apresenta como reprodução do real. (...) para a semiótica discursiva, trata-se, na realidade, de fazer crer ser objetivo, criando o efeito de sentido de objetividade”.
[15] BADIOU, Alain. Ética um ensaio sobre a consciência do mal. Trad. Antônio Trânsito e Ari Roitman. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995, p. 98. O Autor destaca que “é no cerne dos paradoxos dessa máxima que nós encontramos, assim dependente do Bem (as verdades), a verdadeira figura do Mal, em suas três espécies: o simulacro (ser o fiel aterrorizante de um falso acontecimento), a traição (ceder em uma verdade em nome de seu interesse), o forçamento do inominável, ou o desastre (crer que a potência de uma verdade é total).”.
[16] SIQUEIRA, Liborni (coord.). Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 129.
[17] SILVA, Antônio Fernando do Amaral, MENDEZ, Emílio Garcia e CURY, Munir (Coords). Estatuto da criança e do adolescente: comentários jurídicos e sociais. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 434 a 441. O mencionado Autor ao comentar o art. 143 do Estatuto destaca que “sempre se proibiu a divulgação de atos e termos referentes a menores, sobretudo se lhes atribuía autoria de infração, mas as proibições viram-se sempre burladas, de uma forma ou de outra.”.